novembro 07, 2023

JOÃO CABRAL DE MELO NETO


Não há guarda-chuva

contra o poema

subindo de regiões onde tudo é surpresa

como uma flor mesmo num canteiro.

Não há guarda-chuva

contra o amor

que mastiga e cospe como qualquer boca,

que tritura como um desastre.

Não há guarda-chuva

contra o tédio:

o tédio das quatro paredes, das quatro

estações, dos quatro pontos cardeais.

Não há guarda-chuva

contra o mundo

cada dia devorado nos jornais

sob as espécies de papel e tinta.

Não há guarda-chuva

contra o tempo,

rio fluindo sob a casa, correnteza

carregando os dias, os cabelos.



DO MEU BLOQUINHO


 
Aguardo numa sala de espera. Para minha surpresa, livros! Confiro os autores: Jorge Amado, Paulo Coelho, Sun Tzu... Chama atenção um de filosofia indígena, que explica os 4 compromissos... Uma espécie de guia prático para a liberdade pessoal. Reviro as páginas, o livro em sua 18ª edição! Desde 1997. Abro e me deparo: 1. Seja impecável com sua palavra. 2. Não leve nada para o lado pessoal. 3. Não tire conclusões. 4. Sempre dê o melhor de si. Óóóó... Autor? O médico mexicano Miguel Angel Ruiz, um mestre nagual = aquele q guia para a liberdade individual e tem a missão de compartilhar  os  ensinamentos ancestrais do antigo povo tolteca, ao sul do México. Gostei desse consultório! Quase q roubei o livro. Quase.

LUCÍA SÁNCHEZ SAORNIL


 

Lucía Sánchez Saornil  nasceu em Madrid, em 1895. Foi jornalista, poeta e militante do movimento anarcofeminista espanhola. E cofundadora da organização e revista Mulheres Livres, em 1936.

Em algumas de suas publicações usava o pseudônimo de Luciano de San-Saor.

Na batalha da guerra civil espanhola, leu seu poema “Madrid, Madrid, mi Madrid”, na estação de rádio da capital em uma noite de bombardeios ininterruptos:

 

Madri, coração do mundo!

- já não é o coração de Espanha -
como a túnica de Cristo,
os malfeitores despedaçam-te.      

Oh, rondas da minha Madrid, 

rios de sangue e lágrimas! 

Suas noites não são noites cheias de luz até o amanhecer; 

São abismos aterrorizantes em cujas entranhas negras 

explodem frutos maduros e ardentes de uma raiva antiga.

 (...)

 


Madrid, dos subúrbios, 
rio de sangue e lágrimas,
abre o túmulo aos teus mortos!
-Para nós, Malasaña!-
as mulheres vão rugindo,
tremendo de febre e ansiedade,
galopando num acesso de raiva,
com as mãos abertas
procurando nos campos do ódio
as papoulas da vingança.
Madrid, coração do mundo,
coração que sangra!…

(...)



Todas as horas do dia
são interrompidas por alarme.
Sinos correm pelas ruas,
sirenes agudas gritam
na noite da cidade
e contra um terror sombrio
os sonhos quebram suas asas.

Sob as estrelas cantam os aviões negros, 

assobiam cobras da traição que intimidam até a morte. 

O berço que embala a criança não se salva

 porque é um berço; 

e rangendo as raízes, muda de terror,

a casa alonga as escadas e aprofunda o seu núcleo. 

Contra o céu enegrecido, as chamas enfiam a língua!

 


 Lucía morreu em 2 de junho de 1970 

de câncer de mama. 

Ela não deixou nenhum livro de memórias.

No seu epitáfio: 

"Mas é verdade que a esperança morreu?" 

 

 

Hino das Mujeres Libres

Punho ao alto
mulheres do mundo
aos horizontes
grávidos de luz
por rotas ardentes
os pés bem na terra
a fronte no céu azul.
Afirmando
promessas de vida
desafiemos a tradição
modelemos
a argila ainda quente
de um mundo
que nasce da dor.
Que o passado
se afunde no nada!
que nos importa o ontem!
Queremos
escrever de novo
a palavra MULHER.
Punho ao alto
mulheres do mundo
aos horizontes
grávidos de luz
por rotas ardentes
adiante, adiante
de cara à luz.


Lucía Sánchez Saornil 

(1937)

 


PALAVRAS ...



 

Caminhava eu pelas calçadas esburacadas, entre lixeiras opressivas, árvores longevas e prédios lindamente restaurados de Porto Alegre. Destino: 69ª Feira do Livro. Quando deparo com um conhecido. Seria um breve oi não fosse a sua revolta explodir  naquele dia ensolarado. 
E jogou a denúncia no meu colo. 
Lembrei do Mazzarino, jornalista de Encantado, falecido: "em alguma cidade do Vale do Taquari..."  Não acredito! - eu disse. Pois acredite, respondeu:
"Sim, a prefeitura estocou  as doações de garrafões de água e de material de limpeza para distribuir na época da eleição do próximo ano. Ninguém ganhou mais nada."
Malvina de Zeus...  
Você pode comprar meu livro 
na banca da Associação Riograndense de Imprensa.
A feira vai até dia 15 de novembro!

 

WISLAWA SZYMBORSKA


 "Enquanto aquela mulher do
Rijsmuseum
atenta ao silêncio pintado
dia após dia derrama 
o leite da jarra na tigela,
o Mundo não merece
o fim do mundo."

MAFALDA


 

ISRAEL X HAMAS

Hoje completa um mês. Em Gaza, os loucos do Hamas. Em Israel, o louco do Netanyahu. Nas redes, os pró e os contra aos dois. Ums sequencia de imagens tristes, dolorosas. Uma propaganda cruel de ambos os lados. A banalização do terror e da morte. Os inocentes pagam com a vida, de ambos os lados. A morte habita o coração de cada habitante de Israel e da Palestina.  E de Gaza. Foi Carlos Drummond de Andrade que se saiu com essa: "A liberdade  é defendida com discursos e atacada com metralhadoras." Eu diria com mísseis, o proibitivo "fósforo branco" e drones mortais. Extermínio dos armênios no Azerbaijão. Dos ucranianos pelos russos. Guerra na Síria, no Iemên, na Etiópia... Então, nos encaminhamos para o fim do mundo?