Guardachuvadelaura
julho 29, 2009
Oficina de Infrações Literárias
Por uma hora, os internos escrevem enquanto refletem, criam, recordam, concentram-se. No papel, uma porção de si confirmada pela assinatura que resgata o lado B de cada um. Nesse contexto, B de bom.
A assinatura no final dos textos simboliza a crença no futuro. Significa uma auto-estima viva, possível de afetos.
Nos primeiros encontros, a provocação: escrever ainda é uma atividade solitária, presa a uma espécie de cordão umbilical entre o consciente e o inconsciente.
Escrever dá sentido aquela identidade alquebrada onde alguns eus podem ser contemplados: eu-narrador, eu-personagem, eu-escritor, eu-poderoso, eu-frágil – fragmentos intuitivos que vão construindo um mundo entre ficção e realidade e todos os pontos de vista possíveis, de preferência, desprovido de censura.
Já disseram que escrever é também se descobrir, é também transgressão.
Às vezes, parece que é preciso que alguém “abra a porta” para que nosso senso de inadequação, transgressor, se liberte. E esse me parece o grande gancho dessa oficina de criação literária tão especial. Ou seja, a proposta é mesmo de juntar os cacos da própria realidade. E nesse monturo a angústia e o alívio, o prazer de vencer um desafio proposto. Não importa se disfarçada na ficção.
Importa dar voz a vida já tão debilitada por atalhos mal sucedidos da realidade.
O escritor Bernardo Carvalho disse que alguma coisa move o homem a escrever: “você quer lutar contra alguma coisa, com seus limites, é isso que toda arte faz.”
E foi isso nesses três encontros de um julho de muito frio, onde o desafio deles também foi o meu.
RITMO DE VIDA
Minha prima ficou mãe.
Enquanto ela paria, os futuros avós aguardavam nervosos no hospital, aliás, maternidade. Aquele “hospital” era apenas uma maternidade.
De repente perceberam que só eles aguardavam no corredor.
Uma enfermeira se aproximou e quis saber o que faziam por ali.
E a futura avó respondeu feliz e apreensiva que esperava para conhecer seu neto que nasceria em seguida. A enfermeira mandou que fossem passear. Literalmente, conhecer a cidade.
A futura avó disse que empreendera uma longa viagem para agora ir passear enquanto a filha sofria as dores de parto na sala ao lado.
“Mas vai demorar...”– respondeu, confirmando com um balançar de cabeça.
Os bebês demoram a nascer em Grenoble, para a inquietação dos pais brasileiros.
Encurtando a história:
Naquela maternidade as crianças vêm ao mundo pelas mãos de parteiras, que durante cinco anos estudaram para ser... Parteiras.
Parteiras com registro, claro.
A família ‘intrometida’ não acompanha o nascimento. O parto é quase sempre normal, com anestesia raquidiana. E quando a criança está para nascer, os pais são convidados a encostar a mão na cabeça ainda “entalada”... Quando minha prima pensou que o bebê nasceria, tudo parou por uns dois minutos. A parteira aguardava pacientemente a “expulsão “ do bebê porque naquele momento, como visto na tela do computador, o bebezinho resolvera dar uma cochilada: “Assim que ele acordar você faz a força novamente...”.
Na maternidade francesa, o ritmo da vida é observado com paciência.
O bebê nasceu bem e a prima passou quatro dias na maternidade aprendendo a lidar com seu rebento. Caso precise de alguma orientação, alguém daquela casa de partos deve ir até sua casa. Em três meses, o bebê segue para uma creche, onde tem reserva desde sua gestação.
Tudo de graça. Os altos impostos que os franceses pagam garantem educação e saúde.