dezembro 16, 2023

ANA MARTINS MARQUES

Photo by Hildegard Rosenthal


 “A cidade em que se nasce não é sempre a cidade em que se nasce.

Às vezes é preciso partir, com os olhos descalços e o coração ignorado, em busca de um nascimento – os lugares são tantos e é tão difícil reconhecer-se num mapa quanto num espelho.

Alguma cidade se investe num nascimento, entre a mineração e o mar.

Alguma cidade se elege entre tantas para a vida, e nem sempre a vida de regresso.

As cidades também foram inventadas e têm seu destino.

As ruas cruzadas como as linhas da mão.”

COLETÂNEA DE CONTOS INSÓLITOS


 Nessa mesa, a primeira reunião com escritores convidados para participarem do livro, que na época sequer nome tinha. Era apenas uma idéia. E ela surgiu quando li o conto de Marcos Frank, que habilmente misturou história e ficção.  Explicado esse mote, eu sabia que muitos teriam que espiar nos livros do professor Schierholt, um homem que completos 89 anos, pesquisou muito a história da cidade. 

Daí para uma homenagem em vida foi um pulo. 

Alguns concordaram, outros não. Alguns se retiraram, outros não. 

No dia 21, às 19h, no auditório da Casa de Cultura, o lançamento: "Das histórias que sabíamos e um pouco mais", publicação da Editora Libélula.

Fundamental, o apoio da Motomecânica Volkswagen e Arruda Advogados, a quem somos muito gratas e gratos.

Aparece lá!

MEMÓRIAS

... se memória é consciência crítica vale lembrar a fundação da Academia Brasileira de Letras, em 1897. Um dos idealizadores, pasmem, foi uma mulher, a escritora carioca Julia Valentim da Silveira  Lopes de Almeida.

Infelizmente, quem entrou foi o marido Filinto de Almeida, um português, que sequer brasileiro era.


A invisibilidade de Malvina Tavares é histórica, social e política.
Com essa mortalha memorial, não só a educação, mas também fatores como a arte, a cultura, a informação, foram sonegadas dos moradores de Cruzeiro do Sul.  

Ela chega em 1899, com um novo olhar. O olhar de uma mulher letrada em um lugar distante, afastado. Talvez, por isso, gerações políticas acharam por bem manter Malvina em silêncio.

Ao lançar o livro “Malvina” nesse ano, espero ter contribuído com um pouco de luz.


 À propósito: a sede do primeiro jornal de Lajeado: "O Alto Taquary". Espremida, pequena, "pega" enchente. Mas eu daria tudo para ser a dona e restaurar. Q merda ser tão phudida e saber que tem tanta gente com grana que não tem nenhum interesse na memória da cidade.  Logo Lajeado, q pelos dados de 2021, ocupa o 18º lugar entre as cidades mais ricas. Grande coisa... Também deviam conferir o grau de mediocridade e futilidade desse povo. Estaria entre as dez mais.

 http://abrindobaudoschierholt.blogspot.com/

Da esquerda para direita

1°: A casa da viúva Elisabeta Altenhofen Matte. Acabou adquirida pelos Irmãos Maristas, q demoliram para construir o atual prédio do Colégio Estadual Castelo Branco.

2°: Segunda Igreja Matriz, inaugurada em 1901 e incendiada em 1953. Ao seu lado, a Casa Paroquial.

3º: Na r. Borges de Medeiros, o Hotel Comercial. O prédio foi demolido para dar lugar a um posto de gasolina. Defronte, o prédio que abrigou a fábrica de balas de João Frederico Schaan.

4º: Na mesma Borges, à esquerda,  a antiga Intendência, depois Prefeitura, inaugurada em 20-8-1900, atual Casa de Cultura.

5°: Na esquina defronte, o prédio do antigo Banco da Província, demolido para dar lugar ao Edifício Seli. Ao lado, o prédio de dois pisos, da antiga Rodoviária Municipal. Hoje fechada, destino incerto.

6°: No final da mesma quadra, o prédio antigo do Colégio Madre Bárbara, construído em 1911.

7°: Na r. Bento Gonçalves, a sede do primeiro jornal de Lajeado, O Alto Taquary. O prédio ainda de pé, mas descaracterizado por uma reforma.

 

PARA TATUAR...



 Verbum vitae = a palavra dá vida.

Verbum vinc = a palavra  vence.

Vox verbi = a palavra tem voz.

DIVISÃO DE CLASSES



Tela do argentino Antonio Berni
1905-1981

Jornal Boca de rua/Porto Alegre,RS



 

A PRAGA DO CELULAR

É uma pena... Na aflição de filmar e fotografar tudo, perdemos a melhor parte. Algo me diz que isso não é normal. Como fazíamos antes dessa era? - me pergunto.

Lembrei!
A gente comprava fotos do Sebaldo!

 

SEPÉ ON-LINE

Sepé é uma publicação independente, sem fins lucrativos destinada à promoção da leitura e produção literária realizadas principalmente (mas não exclusivamente) a partir do estado do RS. 

A Sepé é destinada à leitura on-line desde fevereiro de 2020.  É editada pelo escritor  Lucio Carvalho e colaboradores. Publica poesia, prosa, não-ficção, traduções, entrevistas e trabalhos acadêmicos , literatura infanto-juvenil, resenhas de teatro/cinema/música.

Na edição deste ano, Vol. 4, N.11/2023, Lucio propôs aos escritores, resenhar um livro com recomendação  de leitura.

A Sepé recebeu mais de 80 resenhas!


Então, se você quer dar um livro e não sabe qual escolher, pode passar aqui: https://revistasepe.art.br/2023/12/14/vol-4-no11-4-2023/

 Participo com a resenha de  “Um detalhe menor”, de Adania Shibli:   https://revistasepe.art.br/2023/12/14/detalhe-menor-de-adania-shibli/

Para minha alegria vi que Meire Brod fez a resenha de “Malvina”: https://revistasepe.art.br/2023/12/14/malvina-de-laura-peixoto/



dezembro 11, 2023

HORÁCIO*


 “Todos nós somos empurrados

para um mesmo ponto,

a urna de todos é agitada,

cedo ou tarde dali sairá a sorte

que nos fará subir na barca para nosso fim.”


*Filósofo e poeta italiano, in Odes II

COLETÂNEA HISTÓRICA - FICCIONAL



 Escrevo sobre Canjiquinha, que descobri nas páginas do livro do Schierholt. Aliás, o professor completa em 2024, os seus 90 anos. Passou poucas e boas pesquisando por aí. Junto, a esposa Renê. Tem histórias ótimas para contar. E outras muito tristes. Mas o que sabemos dessa cidade é mérito dele.  

Essa coletânea só foi possível com o apoio de Arruda Advogados e da Motomecânica.

CRÔNICA DA SÉRIE BEM-VINDO!

 

Foto do site da Prefeitura

“A gente sai da colônia, 
mas a colônia não sai da gente!” 

Quem já não ouviu ou disse?

O que tem de gente que mora e trabalha na capital e em cidades grandes, mas deixou perdido, em algum canto, o chinelo velho para calçar quando um dia retornasse?

Foto do site da Prefeitura

Pouso Novo - descobri que o registro mais remoto da cidade data de 1920 e coube a uma escolinha do tempo dos professores Conceta Paparelli e Júlio Martins, na Linha Forqueta. 

Depois, em 1937, o vilarejo já é considerado um distrito de Arroio do Meio.

Mas, bem antes de tudo, Pouso Novo seria uma picada de passagem, que recebeu esse nome por inspiração de João de Souza Leite, no início do século XX – ou fim do XIX?

Bom, tudo que não é registrado, acaba inventado...

De apelido, João Brasileiro, construiu uma casa-pousada – local da Igreja Matriz - para os viajantes, mascates e tropeiros que transitavam no comércio com  suas mercadorias até oas lonjuras dos campos  de Soledade. Haja carroça, mula, cavalo pra mais de 60 km, tempo ruim, tempo bom.


Parece que tô vendo, a prosa sorumbática de dois peões envoltos nos ponchos, com chapéus de barbicacho, botas enlameadas e esporas gastas:


-Vamu pernoitar onde, seu Juvêncio?

- Naquele pouso novo lá em cima, seu Brandão.

- Pois muito bem. Ôôôô...

Foto do site da Prefeitura


Pouso Novo é uma jovem cidade, de 1988. Visite. Não vi praça, mas vi um bosque  maravilhoso que foi preservado, bem em frente à igreja.

Foto acervo Laura/ Casa construída por Cirilo Pretto.  

Ao entrar na cidade, logo depois do pórtico, desvie os olhos, à esquerda:

Uma típica casa italiana de dois andares, e cinco janelas.

A escadinha leva a porta central. Bem como a gente desenhava na escola.

Doze filhos do seu Bufet já moraram aqui.

Um deles se extraviou por São Paulo e Brasília. Virou cantor e negociante.

Quando se pisa em frente à porta, os sentidos são acordados pelo odor másculo de fumo crioulo, de rolo, sabe qual?  Mais um passo cauteloso e o cheiro dos grãos nos baldes. Logo todos os aromas envolvem a gente, assim, de supetão. Ninguém aparece para atender.


No interior do prédio, uma atmosfera sombria, alumiada pela luz do dia que se intromete pelas janelas. Silenciosa, a casa me aguarda. E eu por ela. Por alguém.

Logo os olhos se acostumam, o impacto é grande: ferraduras para cavalos com bolas de bocha, ferramentas com vassouras, um balcão refrigerado com quase nada dentro e um balcão antigo com “fazendas de pelúcia em metro”, cadeiras e colchões com calças de jeans, parafusos e batatas – uma confusão deliciosa que só um legítimo bolicho pode oferecer!


Ou bodega, como prefere Nico, o filho desgarrado q voltou para a terra dos pais antes que a morte o levasse.  Quando ele aparece, saído não sei da onde, talvez do porão, descubro um sujeito bom de prosa que vai emendando um causo atrás do outro:


“Sou descendente de franceses. Meu bisavô ou tataravô? – era cozinheiro em Paris, fez um jantar e botou tudo na mesa e avisou os convidados q se servissem. Ficou conhecido como seu Buffet. No Brasil, meu pai já nasceu Buffe.” Sim, dançou o histórico serviço de tradição medieval, francesa...


Recostado numa caixa, ao lado de um telefone do tempo do império – funcionando! – dois ou três discos de vinil dos anos 80. Na capa, o jovem Nico Terra. Aposentou o violão, mas o tino comercial o trouxe  de volta para a casa fundada por seu pai.


- É que eu sofri um acidente de avião em 82.

- E sobreviveu?

- Mas fiquei surdo.  Aí deu pra musica.

- Mas acidente de verdade? Quando isso?

- Em 82, eu acho. O avião da Vasp caiu no aeroporto de Brasília. Rachou no meio. Cada asa para um lado.

- E tu pra q lado foi?

- Eu tava no fundo. Não me machuquei, mas morreram uns.


Fui pesquisar. Verdade. “Um Boeing 737-2A1 (PP-SMY) partiu-se ao meio durante pouso no Aeroporto Internacional de Brasília, no Distrito Federal, matando 2 dos seus 118 ocupantes.”


Nico era bem capaz de desfiar, calmamente, uma dúzia de histórias incríveis, em menos de uma hora. O amigo e auxiliar deve saber todas!

- Não tem placa com o nome o armazém, Nico?

- Pra que nome? Que bobagem, todo mundo sabe q é uma bodega.


- Posso fotografar?

- Pode.

- Dá para acender a luz?



Ele se postou atrás do balcão, aguardou minha xeretisse. Trocamos rápidas palavras, e saquei o cartão de débito. Pedi uma água e um pote de melado para pipoca:

-Tem?

-Até tenho, mas não aceito cartão, nem pix. Senão deixa de ser bodega.

- Que pena... Bha, nem sei mais a cor do dinheiro.

- Posso botar no caderno. Outra hora tu passa aqui e paga.


Quando, quando eu voltaria para esses lados? Agradeci, talvez outro dia, depois do Natal, nas férias de verão. Ele me olhou com seus olhos azuis, franziu o cenho num trejeito de enfado. Abriu um armário e botou um pote de melado na minha mão.


Lembrei-me do professor Fischer, em Princeton. Escreveu sobre a confiança dos americanos, q nada some, ninguém mexe e q no Brasil...

Isso porque ele não conhece o filho do seu Buffe.


O bolicho do Nico não consta nos pontos turísticos de Pouso Novo.

Mas você pode incluir depois de visitar a pinguela no Fão, o caminho Perau Vermelho ou da Forqueta, depois de visitar a Cascata do Moinho Canhada Funda. Mas ó, leve di-nhei-ro!

Para se hospedar?  Recomendo o Hotel do Gringo, na BR 386.

Bom passeio!

 

 

 

LITERATURA & RELIGIÃO


Quarta-feira é o dia de Santa Luzia... Um dos mais significativos para o sertanejo nordestino. Leia em Os Sertões, de Euclides da Cunha:

“É a experiência tradicional de Santa Luzia. No dia 12 ao anoitecer expõe ao relento, em linha, seis pedrinhas de sal, que representam, em ordem sucessiva da esquerda para a direita, os seis meses vindouros, de janeiro a julho. Ao alvorecer de 13 observa-as: se estão intactas, pressagiam a seca; se a primeira apenas se deliu, transmudada em aljôfar límpido, é certa a chuva em janeiro; se a segunda, em fevereiro; se a maioria ou todas, é inevitavelmente benfazejo.”

NÉ?