julho 01, 2011

SAMUEL BECKETT



“Se penso que existo,
Não devo existir.
Mas se existo realmente
Posso desistir de existir.”

ARQUIVANDO A VIDINHA


Esta semana promovi uma faxina nas minhas anotações de percurso em agendas, blocos, cadernetas, bilhetinhos e  passei para o computador tudo que achei interessante. Armazenei – armazém? prateleiras, compotas, caixinhas! -  numa pasta reclassificada de “bloquinho”. Em função dessa limpeza escriturada encontrei uma anotação de 2009 que tem muito a ver com minha crônica da semana passada quando escrevi sobre Lajeado e o passado que desmorona.  Literalmente. Por acaso não diferente em Arroio do Meio, Cruzeiro do Sul, Encantado ou Estrela.

Anotei que Amberieu-en-Bugey é um vilarejo francês, com não mais de 13 mil moradores onde pesquisadores de uma Associação pela Autobiografia e pelo Patrimônio Autobiográfico escolheram o lugarzinho charmoso para sediar o encontro: “Escrever a sua Vida”. Lááá em 2009! Qual o objetivo?
Preservar.
Preservar qualquer escrito autobiográfico porque, dizia Freud, a escrita é a linguagem de quem está ausente.
Assim, vale qualquer narrativa  ou testemunho de pessoas comuns que abordam suas próprias existências. Entram diários, cartas, telegramas, fotos, acontecidos que legaram memória nas décadas de 1920-30 e que dão forma ao mosaico que é cada indivíduo.
Muito interessante. Enfim, nós, os comuns, temos vez!
*
Daí lembrei do colega Alicio de Assunção que está ouvindo, e transcrevendo relatos, de pessoas do interior  da nossa região. Contou um caso no último encontro da Academia Literária do Vale do Taquari. Há pouco tempo testemunhou a emoção de uma senhora  comentando que nunca alguém lhe deu “voz”.
Ou seja, nunca lhe perguntaram sobre seu cotidiano e sua condição de cidadã.
Achei muito triste porque realmente todo mundo só quer saber mesmo é de ouvir a si próprio, nesses tempos ególatras. Afinal, quem vai querer ouvir o Outro? Só o Alicio.
*
Agora, imagine leitor, se não preservam os prédios nas cidades, vão preservar testemunho?
Pensando bem, talvez sim.
Prédios derrubados geram futuros investimentos. Lucro absurdo para muitos.
Preservar testemunho não gera nada. Quando muito, identidade de uma época.
É sabido que os “ilustres” ganham certificação no wikipédia, no google, nos livros empoeirados dos arquivos da cidade. E se lá não estão, ainda restam os blogues, verdadeiros diários de intenções autobiográficas.
Ao povo que paga carnê do Sus e chora os seus; a humanidade que ama, trai e vota ordinariamente, resta o suspiro de saudades.
Ou não.
Então que se preservem testemunhos biográficos - de biscateiros, médicos, colonos, barbeiros, parteiras, professores, enfim, gente que fez essa região -  para que ninguém venha nos cobrar falta de sensibilidade no futuro, não é?
Porque, talvez, nem toda a cultura dos antepassados chegue até nossos descendentes pelos impulsos do World Wide Web.


* Crônica publicada nos jornais A Hora, de Lajeado; Opinião de Encantado e http://www.regiaodosvales.com.br/noticia/noticia.php?id=33444

HISTÓRICO GAY


"Em janeiro de 1978, uma intimação assinada pela Justiça Federal - a pedido do Ministério da Justiça - ameaçava com prisão um grupo de profissionais da revista IstoÉ, que tinham assinado, em conjunto, a matéria de capa da edição de número 53, com data de 28 de dezembro, intitulada "O poder homossexual".

A capa da revista, de autoria do diretor de arte e designer Hélio de Almeida, era de uma delicadeza sofisticada e respeitosa, em conformidade com o conteúdo da longa reportagem. Foi por isso - ficou-se sabendo ao longo do processo - que a equipe estava sendo intimidada: por tratar sem caricatura e sem preconceito uma legião de pessoas condenadas ao apartheid - e, naquela época, ao rigor da lei -, meramente porque não se submetiam aos padrões da moralidade (e da hipocrisia) vigentes.

"Apologia de comportamento desviante, anormal e obsceno", bradavam as autoridades, no processo. É bom lembrar que, em 1978, mandava a ditadura fardada e a Justiça era, com raríssimas exceções, um subserviente fantoche dos militares.

Ousadia suprema da IstoÉ: em vez de uma daquelas capas tediosas de Papai Noel e de figuras bíblicas, típicas de falta de imaginação de fim de ano da revistas semanais, levantava um tema incômodo e polêmico."

Fonte: Revista  Brasileiros

junho 29, 2011

RÜDIGER SAFRANSKI



“A burguesia diz
que o mais importante é o dinheiro;
e os românticos dizem
que o mais importante é a arte
(...)
O  romântico sempre aparece
como um excesso de fantasia
e uma falta de realismo.”

KIT INVERNO


.touca, cuecão, bolsa de água quente, cobertor, lençol elétrico, chapéu, aquecedor, meião, vinho, aguardente, bota, lareira, café quente, cachecol, chimarrão, pala, poncho, luva, blusão de lã, casacão, sopa, japona, chá, pipoca, pinhão. 

FAZ DE CONTA


.a guerra contra as drogas é tão ineficaz quanto a lei seca na década de 1930, nos estados unidos. atrás das campanhas de drogas, a droga da corrupção.

DO MEU BLOQUINHO...


Comprar:

 “O Guardador de Segredos” – Davi Arrigucci, Ed. Cia das Letras.

Inteligência com dor: Nelson Rodrigues ensaísta.” – Luis Augusto Fischer, Ed. Arquipélago
Uma Mulher” – Peter Esterhazy, Ed. Cosac Naify
Os anéis de Saturno: uma peregrinação inglesa” - W. G . Sebald –  Ed. Cia das Letras

PEGA TURISTA...



... dois restaurantes onde a comida era uma gororoba
e o atendimento muito ruim.
Não se iluda!

junho 28, 2011

HILDA GOUVEIA DE OLIVEIRA



“A passividade  dos mortos é execrável.
Mas os paradoxos,
as coincidências
e a permissividade da vida
são ainda piores.” 

NINHO VAZIO

Por fim restaram as tatuagens na vidraça. 
Uma bola sem utilidade. 
Uma parede sem computador.
Síndrome da quietude subjetiva.
Ou solidão involuntária.

DO MEU BLOQUINHO...


Praça da Matriz by Emilio Rotta

.resguardando as longínquas proporções:tchecov escreveu as “três irmãs” abordando moscou. edna o’brien focou dublin em “country girls”. nas minhas linhas divago sobre a colônia de lajeado porque, como se estranhou hilda hilst: “sou esta mulher que anda comigo?” sou. e não há nada que possa mudar o meu passado psíquico e o passado dessa cidade emergentemente burra e alienada.

BRASIL: ONDA DE ASSASSINATOS DE AMBIENTALISTAS NA AMAZÔNIA

Leio pela ótica da Agencia France Press sobre o assassinato, em maio deste ano, do casal ambientalista José Claudio Ribeiro da Silva, 52 anos, e sua esposa Maria do Espírito Santo da Silva, 51 anos, que denunciavam o desmatamento descontrolado no Pará.

Desde então, três outros agricultores foram assassinados no estado, forçando a presidente Dilma Rousseff  enviar reforços militares.

Típico do crime: os assassinos cortarem uma orelha como prova de seus serviços. O que foi feito com o casal que fazia parte do Conselho Nacional de Colheitadeiras (CNS), fundada pelo ambientalista e defensor da Amazônia, Chico Mendes, também assassinado em 1988.


Quem são os assassinos do casal Ribeiro?
Os poderosos proprietários de terras e madeireiros da região.
A AFP estranhou a discreta  presença das forças de segurança na estrada de Marabá- Ipixuna Nova,onde ocorreu o assassinato.  Conforme os jornalistas  da agencia de notícias francesas, encontraram apenas um posto policial: "Nós não patrulhamos aqui. Recebemos instruções de Brasília para proteger as famílias em risco", disse à AFP sob condição de anonimato uma fonte do exército em Marabá, que só dispõe de trinta homens para toda aquela área. 

Em uma operação surpresa no dia 18 de junho, os militares evacuaram e abrigaram duas famílias que estavam recebendo ameaças desde o assassinato dos Ribeiro. 
As autoridades agora analisam  "o risco para as famílias" e decidem se  transferem para outra área", disse o procurador Marcio Cruz. 

Os jornalistas franceses ouviram de José Batista, advogado da Comissão Pastoral da Terra (CPT), de que a dependência dos agricultores às autoridades do Pará é limitada por causa do "grau de impunidade" que prevalece.


A Pastoral da Terra, vinculada à Igreja, estabeleceu uma lista de 125 ativistas e líderes camponeses ameaçados de morte no país. Destes, trinta agricultores vivem ameaçados no Pará: 

"Nos últimos 40 anos, tem havido mais de 800 assassinatos no Pará, a maioria perpetrados por assassinos contratados. No total, conseguimos fazer o julgamento de apenas nove líderes suspeitos, resultando em oito condenações e dos quais apenas um está na cadeia ", disse Batista em entrevista à AFP. 

Esta onda de assassinatos na Amazônia acontece no momento em que se debate as leia que deveriam proteger a maior floresta do mundo e  as facilidades que beneficiam os produtores agrícolas.

A reforma aprovada em maio de 2011 pelos deputados prevê a legalização de de florestas desmatadas, numa área que é dezesseis vezes o tamanho da França e onde 1% da população detém 46% das terras aráveis. 

O Brasil se tornou um grande exportador de produtos agrícolas (soja, grãos, carne), e os proprietários estão tentando ganhar terreno na vasta floresta tropical Amazônica.

Fonte: Agence France Presse
* Impunidade noves fora, país de merda, cidades de merda, governo de merda.
Merda neles.

junho 27, 2011

SCOTT FITZGERALD


Na noite profunda e escura da alma,
são sempre três horas da madrugada.

MICRO-HISTÓRIA

Domingo de manhã silenciosa e uma caminhada até a beira do rio Taquari.
Observâncias de percurso: todas as cidades do interior começaram assim?
A igreja, a prefeitura e a escola ao redor de uma praça com árvores patriarcais?
Às vezes, hoje, um Banrisul na esquina.
Às vezes, ontem, um hotel assombrado, na outra.

Pois a rua mais antiga de minhas lembranças em Lajeado é vizinha perene do rio e ainda preserva, oxalá, grandes paineiras. É a Osvaldo Aranha. Com ou sem enchentes.
Talvez a homenagem explique nossas origens políticas: os chimangos de Borges de Medeiros apoiado pelo efêmero governador Aranha que depois viria se incrustar no PL e UDN, mais tarde abrigados devidamente sob os coturnos da ARENA e então nova metamorfose para aglutinar o PFL aí virando DEM e PP  ou sei lá mais o que -  governo sem trégua  na cidade que escolhi para viver.
E é ainda  na Osvaldo Aranha que se encontra o primeiro calçamento da cidade disputando espaço com o iminente asfalto e com uma ciclovia que atrai - quanta ironia - crackeiros e caminhantes saudáveis quase lado a lado.

Outrora, os sobrados rivalizavam em beleza com os casarões da Julio de Castilhos, esta sim, ainda hoje a principal rua de Lajeado - com seus aluguéis comerciais extrapolando o ridículo. Em algumas destas verdadeiras casas de memória, os proprietários insensíveis tocaram fogo. Outras foram reformadas dando lugar a supermercado e pontos comerciais de estética tacanha. E assim, as poucas moradias - ainda resistentes - lutam para preservar a história da cidade, como o primordial Banco Alemão construído no início dos anos 30, prédio que se deteriora dia a dia.
Um parêntese: como anda a preservação do patrimônio histórico de sua cidade?

Continuando minha caminhada e avançando à sombra dos 120 anos de Lajeado chego à  Praça Marechal Floriano ou Praça da Matriz e contemplo a Casa de Cultura e ex-prefeitura e alguns casarios teimosos na Borges de Medeiros; no outro lado da praça, já na Bento, o silêncio acolhedor da Igreja da Matriz e o antigo colégio dos irmãos Maristas depois Colégio Estadual  Presidente Castelo Branco, outra homenagem para reafirmar nosso potencial político. Dobro à direita na rua Mal. Deodoro: o velho Fórum da cidade e atual Brigada Militar assim como o “moderno” Correio, infelizmente, prédio abandonado. 
Voltando para a Julio: a querida papelaria Cometa, a casa da família Müller desde 1940 e o lar das irmãs Jaeger construído em 1926; dessa esquina pode se ver a antiga escola da cidade edificada em 1930, depois transformada em  rodoviária e hoje um cabaré decadente. Não deixa de ser pitoresco.



As cidades são assim: umas valorizam a herança deixada pelos antepassados.
Cultivam suas lendas e personagens populares.
Outras, não. Apenas cidades-verniz onde poucos se dão por vencido.
No passado, acomodava-se na principal ruazinha do interior, o barbeiro, a  rodoviária, o posto bancário.
Hoje, o coiffeaur, o shopping e o wallmart.
Voltar está muito próximo de não se reconhecer, não é? 

* Crônica nos jornais A Hora, Opinião.