fevereiro 17, 2012

EMIL CIORAN



"Não invento nada.
Simplesmente,
sou o mensageiro das minhas sensações."

BREVIARIO DE SINTOMAS

Em 1924,  editor René Hilsum encomendou ao poeta  Paul Valéry  24 poemas em prosa, com a inicial do alfabeto. Surge o caderno rosa, ou o caderno abc, que trazia escritos or fragmentos abstratos. A mim, inspirou um exercício de fluxo de consciência medido por  palavras.  Gosto delas assim soltas, poderia colecioná-las. Criei então o meu alfabeto particular, um guia do inconsciente. Ou de sintomas.

Abismo. assombro. amoroso. arriscar. ambíguo. ausência. armadilha.

Bêbada. beata. bacantes. brisa. bailarina. breviário. boemia. bufão. breve.

Cego.casto. cristo. cronos. carne. caleidoscópio. cartagena. catalunha. caverna.

Delírio. desejo. dardo. dor. decadência. diáfano. dúbio. dragão. doído. despedida

Erosão. espinho. ébrio. escolhas.  eclipse. embuste. espantalho. eros. ebulição.

Falo. fetiche. fera. filosofia. fissura. feitiçaria. fogo-fátuo. fervor. fragmento.

Gentalha. grito. gerúndio. guirlanda. garganta. gralha. gárgula. gaiola.

Halo. horizonte. hipócrita. herói. hímen. honra. hortelã. hálito. hermafrodita.

Infância. ilha. insônia. incógnito. infinito. ídolo. ígneo. irracional. insensatez.

Jaula. judas. juras. jamais. joio. jagunço. jejum. joão-de-barro.

Ka. ke. kitsch. ko. ku. kuarup. kundalini.

Luar.  limo. leveza. leila. l’amour. lenda. labareda. libertino.

Mágica. memória. mistério. mergulho. mentira. maldito. medusa. menestrel. mundéu.

Nuances. noite. néctar. narcótico.naufrágio. neurose. ninho. nó. nu. narciso.

Ontem. obsceno. oca. óbvio. oculto. ócio. ódio. opressão. ôm. oriente.

Perverso. puta. plenitude. palhaço. perigo. pluma. paciência. potência. pilantra. pó.

Quadrado. quadril. quantum. quietude. quase. queimação. quenga. quiçá. quintal.

Raiz. resquício. reviravolta. revolta. rim. resistência. risada. rodamoinho. ritual.

Sangue. suor. saliva. secreção. sopro. sermão. sonho. silencio. seda. sim. senão.

Transparência. tempestade. trevas. tépida. tom. tumor. tabu. talismã. tibum.
Utopia. unidade. uivar. universo. umedecer. ungüento. uníssono. urgência. urro.

Vereda. vastidão. vazio. vagina. virtude. visão. vacilo. vil. volupia. vertigem.

Xadrez. xeque-mate. xexéu. xucro. xará. xifópagos. xodó.

Zênite. ziguezague. zimbro. zunzum. zarabatana. zênite. zepelim. zé-povinho.

EMIL CIORAN: O INSONE



Ou o cara da solidão. Escritor e filósofo romeno. No mundo virtual vc procura uma coisa, acha outra e  segue adiante sem escrúpulos. Em Silogismos da Amargura, Cioran escreve:
“Só vivo por que posso morrer quando quiser: sem a idéia do suicídio já teria me matado há muito tempo.” - por isso nos afogamos no mar ou no álcool..? o meu tédio, a minha decadência, só não é maior porque tenho a internet. Sério. Queria o que nesse cu de cidade? Então, chupando do mundéu virtual e a quem interessar possa:

“Sua juventude foi marcada basicamente por dois fatos, que repercutiram profundamente em sua vida e obra posteriores. Por um lado, a intensa crise de insônia que o consumiu durante anos a fio, quase chegando a levá-lo ao suicídio - e da qual resultou sua primeira obra, escrita ainda em romeno: Nos Cumes do Desespero.”

Ao longo de sua  vida, Cioran  escreveu sobre os temas que o preocuparam e o atormentaram:  solidão, o tédio, a morte, o sofrimento, o ceticismo e a fé, Deus e o problema do mal – todos esses temas ele mesmo atribuiu à insônia que o assolou desde a juventude.

Considerado por alguns o maior prosador da língua francesa, desde Paul Valéry, e aclamado pela crítica, entre outras coisas, de "pensador crepuscular", "arauto do pessimismo", “ cínico fervente", "cavaleiro do mau-humor".

E foi isso. Cioran morreu em 20 de junho de 1995 e eu descobri meu filósofo no verão inclemente de 2012.

fevereiro 16, 2012

ANAIS NIN


"O amor nunca morre de morte natural. Ele morre porque nós não sabemos como renovar a sua fonte. Morre de cegueira e dos erros e das traições. Morre de doença e das feridas; morre de exaustão, das devastações, da falta de brilho." 

TRILHA SONORA

INTERNIDADES

meus meridianos mal traçados meridianos
por que tu,  insônia?
fusos que se encontram difusos
por isso.
minha cartografia interna  doente.
madrugada e meu território
em sobressalto
acordo
em claridade e trevas
meu eu noturno
ninguem vê o  desespero
arrasto pela casa escura
mil cacos
porque tu, insônia.

horoscopo

ANAIS NIN: 35 ANOS


Não vi nada nos jornais. Enfim, talvez não inspire a periferia... Na colônia em que vivo passou batido mesmo.

Ta no wikipedia:
 Anaïs Nin tornou-se famosa pela publicação de diários pessoais, que traçam  um período de quarenta anos, começando quando tinha doze anos. Foi amante de Henry Miller  e só permitiu que seus diários fossem publicados após a morte de seu marido Hugh Guiler.

Seus romances e narrativas, impregnados de conteúdo erótico foram profundamente influenciados pela obra de James Joyce  e a psicanálise. 
Dentre suas obras destaca-se Delta de Vênus (1977), traduzido para todas as línguas ocidentais, aclamado pela crítica americana e europeia.
Em 1990 o  filme Henry & June,  de Philip Kaufmann mostrou o período que Anaïs Nin conheceu  o escritor, assim que ele se muda para França e quando é convidado por Guiler a visitá-los.
Anaïs, à procura de algo novo, mais espontâneo, logo se apaixona pela vivacidade de Henry. Porém... Henry é apaixonado por June.

Anaïs, nutrindo admiração por Henry, começa a observá-lo, e se apaixona pelo amor que ele sente por June.
Essa paixão a faz apaixonar-se, também, por June.
Em meio a esses sentimentos, inicia-se o caso de Henry com Anaïs, transformando suas vidas, tanto de escritores quanto de amantes.

Pois então... para uns, a vida já nasce filme.
Outros, trailer.
Nós, youtube.

fevereiro 15, 2012

MACEDÔNIO FERNÁNDEZ

photo by ruy palha

"Há beleza: para acariciar
A ânsia de um mundo,
Para adormecer em lassidão de conquista
A peregrinação dessa busca descaminhada e pressintente
Que é senso da realidade.
Busca sem conhecer caminho nem como é o desejado,
Que será aquilo que lhe tem guardado aplacamento
E trocará sua dor de sede por delícia.
Em todo o sonho do real
Há beleza: para deter toda a Dor."
Museu do Romance da Eterna
Ed. Cosacnaify

TRILHA SONORA

THE VULVA

“a rosa do mundo não é para mim.
para mim quero apenas 
a pequena rosa branca da escócia
de cheiro agreste e doce — 
e que destroça o coração.”

hugh macdiarmid (1892-1978)
trad. sara soares de oliveira
 rosa do mundo

IGNORÂNCIA ETERNA

obra de Margret  Spohr

De que mesmo serviu tanto tempo correndo atrás de grana, tanto tempo desperdiçado em mesquinharias e tantos outros minúsculos?
Quem realmente voltou do Outro lado para assegurar “leve toda sua poupança, seus cartões de crédito, seus dólares e jóias, por que o paraíso é um vidão para quem tem crédito.”- quem?
D’us, a gente passa a vida inteira desenrolando escolhas: fazer vestibular ou trabalhar, comer ovo frito ou  brócolis refogado, viajar para China ou reformar a casa, Grêmio ou Inter, casar ou viver sozinho, votar em branco ou anular. Então, é só disso que vão se lembrar quando morrermos: das nossas opções?
Ele gostava de jogar futebol com os amigos.
Ela gostava de pedalar todo fim de tarde.
Eles tiveram filhos e um dia se separaram.
Ele casou de novo. Ela fugiu...

INFLUÊNCIAS
Quando criança pensava que para cada tipo de vida, um tipo de morte.
Por isso mafioso italiano caía cravejado de bala e soldado da cavalaria americana morria trespassado por baioneta. Muito cinema. Muito.
Ele gostava de faroeste mexicano, ela de romances açucarados.
Ele era um Vadinho, ela uma Tieta, e esse ano comemoramos os 100 anos de Jorge Amado.
Ele optou por ser um homem honesto, ela por ter uma vida bela.
Ele roubou até o fim da vida e transformou a cidade num jazigo in memoriam e hoje tudo leva seu nome. Como a família Sarney na capital São Luis, no Maranhão: ruas, escolas, prédios governamentais, hospital, quase tudinho leva uma sarna de apêndice.  E aí já não é ficção, é amarga realidade: o Maranhão de Sarney é o segundo estado mais pobre do Brasil. Espero que quando ele morra não continue por aqui  assombrando os brasileiros feito um encosto azedo.

LEMBRANÇAS FUNESTAS
E já que o assunto é sobre morte morrida, recordo o velório de meu avô, no interior de Vera Cruz. Uma beleza! Casa cheia, um cheiro de estrume de roça entrando pelas janelas empoeiradas, muita roupa preta com cheiro de guardado cobrindo uma gente com suor de fevereiro, mesa grande e farta para data tão especial que até marreco recheado foi servido, mosca pingando em cima das cucas recheadas e lingüiças defumadas, pessoas antigas falando alto, parentes que há muito tempo não se viam, muita novidade para contar, muito óóós e o meu avô ali sozinho, perdendo aquele encontro em pleno carnaval.  Disso lembro e guardo saudades boas de um tempo que se perdeu.
Tenho impressão que do jeito que esse mundéu gira daqui um tempo as pessoas nem vão mais saber dos seus sentimentos. Saudades? Do que se trata mesmo?
Aí não tem como explicar. Tudo muito urgente, muito efêmero, muita liquidação e cada um de olho no próprio celular.
As coisas mudaram tanto que nem a chama da vela do velório é de verdade e se você não puder comparecer a despedida, acompanhe a tristeza pelo computador, em sua casa, do outro lado do país, do planeta.
Mas tem coisas que não mudam: as pessoas continuam falando alto na maior falta de educação para com os familiares e ignorando a presença do personagem principal.
Tenham dó.

* Minha crônica no jornal Opinião, de Encantado.

PAUL VALÉRY

Bansky
“Quantos despertares
não desejariam ser apenas sonhos?”

A PARIS DE CADA UM


De passagem por Paris? Vontade de não se parecer com um turista qualquer? De ser breve, mas intensa? Efêmera, mas inesquecível? Uma vez na vida, não seja miserável... Experimente os morangos de chocolate Godiva,  pertinho da  Place Vendome. Sim, cometa esse crime, talvez você não volte nunca mais...
237 Rue Saint Honoré, Arrondissement 1.
Ao anoitecer, vá até a Pont Neuf,  curtir o pôr do sol no Sena. Nos ouvidos, Louis Armstrong sussurra céu, estou no céu...  
Os melhores croissants você encontra na esquina da Pigalle, na padaria da  Tina: 1 rue Lepic, Arrondissement 18. 
Por fim, uma boa Sex Shop? Passage du Désir no Chatelet: lingeries delicadas, velas e acessórios eróticos e tudo  mais que a gente precisa para passar o próximo  inverno embaixo do edredom: 11 , Rue Saint-Martin, Arrondissement 4.

fevereiro 14, 2012

É O MEU COPO

por isso furo, vazo, aborto, encharco, mutilo,  pinto, dobro, fatio, engordo, tatuo, entrego, abro, sangro, vendo, deito com ele na sarjeta, deixo-o vomitar no quintal as três da madrugada com a lua de testemunha e o silêncio de cúmplice.

CARLITO AZEVEDO

“A poesia é uma droga sem tratamento.
E como todo dependente, quando vem a crise,
você se dilacera
entre a necessidade de conseguir mais droga
e a de parar com aquilo.
A minha crise particular ocorreu
quando me dei conta de como era obsceno
trocar a própria dor por poesia.
Trocar os seus pesares, como dizia Drummond,
por contentamento de escrever.”

TRILHA SONORA

Avalokiteshvara... Minha cidade frita, torra, queima. Ontem foi a 40º. 70 mil habitantes, 140 mil olhos e ninguém vê a falta do verde nas ruas e nos bairros? Socorro, orra.

GÊNERO MASCULINO E SUAS VARIAÇÕES


Pode ser em Encantado.
Pode ser em Arroio do Meio, Estrela, Cruzeiro do Sul.
Pode ser em Lajeado.
Pode ser no interior do Rio Grande do Sul ou nas capitais do país.
Onde você  perceber um grupinho reunido, principalmente de mulheres, o assunto que desperta nossos cinco sentidos é sempre o mesmo:
Homens.
E no desenrolar do fio, o tema que decompõe os anos e intrigam os  cronista – antes de Machado de Assis – superando modismos, derrubando preconceitos e tabus, fazendo com que freudianos ocupem as páginas dos jornais e revistas, que cientistas sociais  dobrem-se ante as câmeras de tevê (aqui desnecessário citar o cinema),  mas as conversas sempre acabam em...

SEXO
E para chegar até “traição”, não precisa fosso, ponte, abismo. Parece um  mantra:
homem, sexo, traição, homem, sexo, traição, homem, sexo, traição.
As esquemosas choram os descasos e gargalham despudoramente sobre seus casos. Depois se refugiam no banheiro e retocam a maquiagem. Prontas e perfumadas, tratam de  ligar o radar: Onde?
Onde eles estão? Onde se escondem os homens? E por que tão distantes?
As casadas ostentam os seus exemplares com orgulho: O meu taqui ó.
Sim, querida, hoje estava, amanhã pode não estar mais e dê-lhe fluoxetina nessa alma oca e  encurvada.
Encurvada em frente aos folhetins da tevê Marinho.
“O que dói não é a transa com  tesão passageira. O que dói é a transa com amor.” – disse minha amiga aos prantos, fumando um cigarro atrás do outro e eu perdida na fumaça constrangedora. E muda.
“Quero que queimem no inferno, os desgraçados.”- gemia essa despedaçada amiga.

TRAIÇÃO
Sim, pensei, se trair é pecado, melhor que os desalmados queimem em vida, execrados pela opinião pública.
Não tanto.
Mas pela vizinhança, pelos colegas de trabalho e de partido político.
E não adianta jogar pedra no telhado vizinho: a humanidade é adúltera e há de se conviver com isso.
Ainda tem gente que acredita que trair não é pecado.
É sim! É pecado quando se trai com amor, com avassaladora paixão.
É isso que dói e parece nunca cicatrizar.
Trair até podemos suportar.
Mas trair com amor é roubar nossa esperança.
É trair as nossas brincadeiras dos tempos de menina.
Trair é desacomodar.
E desacomodar incomoda.
Ou não?

* Minha crônica no jornal Opinião, de Encantado.