março 16, 2015

PAULO LEMINSKI

"Salve-se quem quiser,
perca-se quem puder."

POVO CONSCIENTE

 photos by Renan Silva

Tanto tempo neste espaço cibernético, desconfio a mesma ladainha, embora de lupa parece maior o estofo da ladainha. 
Onde moro, 71 mil habitantes. É grande comparada as outras da região, pequena se com as do estado. Politicamente, lajeiros da arena. Hegemonia quebrada pelo mdb, certa vez. Foi quando o prefeito- engenheiro agrônomo criou o Jardim Botânico e a primeira ciclovia da cidade. E quando esse partido valia alguma coisa, se é q valia. Agora, o governo é pt. Elegeram de lavada depois de 20 anos de “ação” ativa do pp. Claro, nunca comprovado. Mas estão aí os processos judiciais q não me deixam mentir. E os enriquecimentos ilícitos. Prefeitos, vices e secretários q negociaram terras dos colonos  a preço de banana flambada pq sabiam - logo virariam loteamentos – com a cumplicidade dos vereadores de legenda q alteraram o plano diretor. Construíram prédios onde antes bairros residenciais. Assim tanto o Jardim Botânico como o Parque Histórico foram amputados para beneficiar ruas em novos loteamentos. Lajeado e as homenagens refletem os anseios da sua população: avenida pres. Castello Branco no bairro Moinhos, rua Artur Costa e Silva no bairro Campestre, Colégio Estadual Presidente Castelo Branco no centro. Explica o barulho de quem sempre mamou e agora perdeu o úbere.


No domingo, os anti pt, anti dilma e os ingênuos subiram a rua para uma passeata. Se pelo menos a manada tivesse descido. Daí onde você menos espera, não espere mesmo. Lá estavam as garotas com hora semanal agendada nos salões de beleza empunhando seus cartazes. Lá estavam os corruptos do passado. Lá estavam os petistas do passado. Lá estavam os empresários q fraudam o imposto de renda. Lá estavam os receptadores de muamba do Paraguai e Maiami. Lá estavam os propineiros do governo pp vestindo a camiseta corrupta da CBF.  Lá estavam... Um sujeito q roubou do amigo e mora numa cobertura. Um q fazia treta na empresa e foi demitido. Uma q pediu e não levou.Como dizia Orlando Todisco: "O ser como expressão do direito de ser."
Vivo em uma cidade ainda pequena e de preconceitos mal disfarçados, q desejava erguer um presidio em um bairro pobre da cidade.  No mesmo local construíram prédios do Minha Casa, Minha Vida. Que raiva, não é? Tem q protestar mesmo. Minha cidade sempre  agrediu o Meio Ambiente expedindo licenças falcatruas para construir edifícios minando nosso bem espiritual, botando abaixo casas e quintais, comprando os moradores. Minha cidade espantada com tantos haitianos nas ruas, morrendo de medo deles e que do cúmulo e por cúmulo, se posiciona: “Já montaram um time de futebol, não demora estarão competindo nos nossos campeonatos.” Saudades do Imperador gritando, no horário nobre, na telinha:
- Maria Marta, me faz um favor, vá à merda!
No elevador, a trabalhadora brasileira na BR Foods diz q não foi protestar. Porq não? – me espantei.  “Não adianta nada. Eles sempre fizeram o q queriam, tudo da cabeça deles.” 
Mas tem q protestar, reivindicar o q te pertence, insisti. Exigir mudança. Ela deu uma risada e desceu no oitavo andar, sem dar tchau. Fiquei olhando o reflexo das minhas rugas no metal lustroso do Thyssenkrupp. 
Cara de ontem.

CONVITE PARA O CHÁ DAS CINCO


“Eu não sou mais a de ontem
Eu não sou como serei amanhã
Mas posso dizer como sou hoje
com o meu ontem.”

Alda Merini
escritora e poeta italiana

março 02, 2015

TOMIO KIKUCHI

"A tecnologia está cada vez mais 
prejudicando a humanidade, 
destruindo a ordem ecológica.
Chegou o momento 
em que a natureza responde."

SOCÓ

Assador de churrasco no Centro de Tradições da cidade, aquele homem simples, melancólico, com suas culpas e sem maiores esperanças, um homem alto e magro, que vestiu bombacha e botas a vida toda, aquele homem de olhos mansos e escuros, nariz grosseiro e manchado, hálito ruim que chegava através  de trinta cigarros por dia, de pescoço longo, voz grossa e rouca, de poucas palavras, daí o apelido, Socó, era o meu vizinho. Era?
Foi assassinado nessa rua, que vai daqui até o cemitério. Foi abatido como uma ave no campo, à sombra da madrugada de um domingo. Ninguém viu, mas ouviu quem tem a soleira da porta junto à calçada. Três tiros e uma queda silenciosa. Um lascou a parede lateral do Hotel. Dois acharam o peito de Socó.
Logo as venezianas abriram suas frestas, fachos suave dos lampadários se acenderam, um grito de mulher rouquejou na porta aberta da oficina mecânica, os passos de chinelos apressados nas escadas dos chalés, também o padre da canônica veio para fora. Alguém correu até a esquina da praça. Alguém correu até a prefeitura e o guarda da noite ligou para o hospital. Demorou, mas apareceu  uma ambulância. Nem que demorasse dois minutos, Socó não agonizou. Morreu com um espeto na mão, trazendo para a mãe uma minga mal assada, agora suja de terra. Os vira-latas da rua logo se encarregariam de sumir com a carne. Ninguém arredava, todos falavam ao mesmo tempo até que chegou o fusca da patrulhinha. Minha mãe me abraçou e disse vamos entrar. Ah, mãe... Entra! Amanhã tem que acordar cedo, tem aula.
O assunto rendeu dias na cidade. A imprensa provocou a todos com suposições das mais sérias e outras tantas mais irônicas. Socó não merecia. Ele sempre tão calado e discreto, tão diferente dos outros assadores da cidade, agora na boca do povo.
Por fim, descobriu-se a culpada. Dona Floriana, mulher do patrão do CTG, aquele que precisou honrar o casamento e matou Socó, quando ele voltava de um sarau de prendas, convocado para trabalhar nas churrasqueiras.
Vingado, o patrão foi embora da cidade. E Floriana?

Virou macho. Porque essa cidade é terrível como a planície de Cistene.

SERIA A NATUREZA O MEU DEUS?

Deus existe? Existe? Deus? Ala, Maomé, Jeová? Krishna, Xangô, Sidarta? Por favor, você existe seja lá que nome tem? Não. Como assim...  Não? Se existisse não haveria criança estuprada. Não nasceria criança vegetativa. Não haveria crueldade nem humilhação na velhice. Se um todo poderoso que escuta nossas orações nunca teria existido escravo feito mercadoria. Não existiriam gananciosos nem fascistas. Muito menos preconceitos e desigualdades. Se ele realmente existisse a África seria um continente feliz. Não existiriam doenças como esclerose lateral amiotrófica. E nunca teria existido um Ivan IV, um al-Baghdad, um Pol Pot, um  Herodes. Não teria acontecido uma santa inquisição, uma bomba atômica sobre Hiroshima, um jihad e se ... E a Esperança que nos sustenta? Frágil como uma chama de vela. A vida eterna  é um mito criado pelos homens para justificar as religiões e suas guerras. Então... o que realmente existe? Apenas a Natureza. Idolatrem a Natureza e todos nos salvaremos. Se um Deus, esse atende pelo nome Natureza. Necessidade de rezar? 

Força nossa que estais na Natureza, santificada seja o Vosso reino. Venha a nós a vossa divindade natural. Seja feita a Vossa vontade assim na Terra como nas Aguas e no Céu. O pão nosso de cada dia nos dai hoje e basta. Perdoai as nossas ofensas por ignorância, não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal para que todos possamos sobreviver em Paz, amanhã e sempre. Uma oração serve para mudar a natureza menor daquele que reza e não para divinizar o deus de cada um.

ORLANDO TODISCO

“Os inimigos não existem fora de nós.
A fonte deles 
é a mesquinhez de espírito,
a miopia da inteligência”  

ENCERRANDO O ANO





Último dia do ano... Madrugadando às quatro horas da manhã... Um pouco mais tarde, uma caminhada até a banca para comprar os jornais. De volta, com O Sul e o Correio do Povo embaixo do braço, a sorte de encontrar uma amiga que pouco vi nesse ano que amolece de calor e chuva. Um abraço na artista plástica Rute Krug. Um bem apertado, daqueles que transcende a culpa. Rute fez uma (ou duas?) exposições da sua arte bacana e sensível neste ano. Não consegui ir. Em Novo Hamburgo. Nos despedimos com outro abraço e o desejo de nos vermos mais a partir de amanhã. Suspiro. Em casa me armo de lupa e vou trabalhar em uma das caixas do arquivo do fotógrafo Sebaldo Hammes, que se foi em Janeiro. Antes uma passadinha por aqui. Para quem está lendo, anote: faça por você, faça algo diferente por você em 2015. E olhe para o Outro. A vida não tá facil? Olhe para o Outro. E não só para o seu umbigo, o seu espelho, a sua cama... Até 2015!