março 27, 2013

MANOEL CARLOS



 photo by Daisy Fellowes

"Existem pessoas que falam mal de todo mundo, inclusive de parentes e amigos. Outras, ao contrário, falam bem até dos inimigos. Cruzamos na vida com umas e outras e temos de conviver com a existência de ambas. Conviver e compreender que as que falam mal nem sempre são pessoas essencialmente más. E as que falam bem nem sempre são boas. É apenas uma maneira de oferecer sem dar. E de dizer “toma, pega” e estender a mão fechada."

MALA & PASSAPORTE


1 Fui a Jerusalém. Minha mãe pagou tudo. O meu grupo de viagem de seis incluía ateus e crentes, realistas e otimistas. Os que viajavam para conhecer lugares históricos e os que buscavam Deus. Se há um lugar onde um descrente não deva ir é Jerusalém. Principalmente, claro, se você pertence ao grupo dos ateus e realistas. A terra santa é entupida de gente, coisa de um milhão de visitantes por ano, um calor sufocante, mas não úmido. A maior decepção foram as estações por onde Jesus passou. Estão cobertas de quinquilharias turísticas e a gente quase passa batido. Ah, sim, lamento dizer, Deus não estava em Jerusalém. E como estaria com tantas contendas e até um muro de discórdia? Mas, se você insiste na viagem, não deixe de visitar o Museu da História do Holocausto e o espetáculo noturno na Torre de Davi, na cidade velha, que conta a história de Israel. Bem bacana.
2 Também fui a Belém, na mira dos palestinos desde 1995. Belém significa a "cidade do pão". Foi quando conheci Nicolas, o nosso guia. Os ateus não foram. Foi a única oportunidade durante toda minha viagem para Israel onde consegui conversar sem papas na língua com alguém que vive por lá. Tudo virou assunto: história, sexo e filosofia. E sem uma gota de álcool. Nicolas só entendeu minha curiosidade e o atropelo de perguntas porque já morou fora do país quando pequeno, com a família em Honduras. A desenvoltura  indica que absorveu um pouco da cultura latina. Regressaram quando a loja do pai incendiou e não conseguiram dar a volta por cima. Nicolas tem 29 anos e fala um português surpreendente, assimilado no trato com os turistas. É um árabe gentil, educado e com muito senso de humor. Nada das imagens estereotipadas onde seus conterrâneos exibem na mão direita um fuzil e na outra o Alcorão. Ou vice versa.
3 Nicolas contou que depois das últimas e sérias confusões políticas na região, perdeu a liberdade de ir e vir de Jerusalém. Antes trabalhava na capital de Israel. O que se faz aqui já que não se pode beber em buteco, fazer festa ou sequer pegar um cinema? Nada, respondeu. Nicolas trabalha como guia, joga bilhar, passeia de carro e acessa internet. Estou preso dentro dessa cidade e minha alma também. Foi o único momento triste de nossa conversa. Não era casado. Precisava dispor de um dote de 40 mil dólares para se unir a noiva. Sem condições, disse. Então mora com a família. Jura que em Belém não existe drogas nem prostituição. E os gays não se revelam por medo da discriminação. Foi pela internet que ele conheceu Florianópolis, Rio e Fernando de Noronha e passou a torcer pelo Grêmio. Desconfio que se fossemos turistas cariocas, ele seria torcedor do Flamengo. Dias depois, Serjão Seppi, jornalista de Encantado, mandaria para ele uma camiseta do tricolor. Despedimos-nos com boas gorjetas para ajudar no dote de Nicolas. Ah sim, voltei feito muambeira de quinquilharia. Mas nem os imãs de geladeira funcionaram.


CURTINHA

Por que tu bates com tanta força nas teclas?
Por que tenho saudades.
?
Do som das maquinas de escrever. Tac, tac, tac...

Só quem viveu, sabe.

MARINA ABRAMOVIC & ULAY


"Nos anos 70, Marina Abramovic viveu uma intensa história de amor com Ulay.
Durante 5 anos viveram num furgão realizando todo tipo de performances.
Quando sentiram que a relação já não valia aos dois, decidiram percorrer a Grande Muralha da China; cada um começou a caminhar de um lado, para se encontrarem no meio, dar um último grande abraço um no outro, e nunca mais se ver.

Passados 23 anos, em 2010,  quando Marina já era uma artista consagrada, o MoMa de Nova Iorque dedicou uma retrospectiva a sua obra. 
Nessa retrospectiva, Marina compartilhava um minuto de silêncio com cada estranho que sentasse a sua frente.

Ulay chegou sem que ela soubesse..."


*... vazaram-me os olhos.