GOLPE ORVIL
"O que conformou a mentalidade de Jair Messias Bolsonaro e
seu clã?"
O Bolsonaro, mais do que um político, é uma franquia; há uma franquia Bolsonaro de políticos.
Para o professor João Cezar de Castro Rocha, a mentalidade de Bolsonaro foi moldada numa linha muito particular do Exército brasileiro: o ressentimento, "a partir da repercussão de um autêntico
livro-monumento lançado em 1985 que é o livro Brasil: nunca mais.
Esse é um livro particularmente importante porque denunciou
as torturas, as arbitrariedades e desaparecimento de corpos da ditadura militar
de uma forma incontestável.
Sob o patrocínio do cardeal dom Paulo Evaristo Arns, ele
principiou em 1979, quando os advogados de presos políticos tiveram acesso aos
processos de seus clientes e ganharam o direito de ficar com eles durante 24
horas.
Eles xerocaram os processos do Superior Tribunal Militar,
reunindo aproximadamente 6 mil páginas, e eis a surpresa: em processos
instruídos pela própria Justiça Militar, isto é pela própria ditadura militar,
os presos denunciaram aos juízes militares as torturas que haviam sofrido.
O Brasil: nunca mais reúne um conjunto de depoimentos de
jovens de 20 e poucos anos, extraídos dos processos da Justiça Militar, em que
todos fazem o mesmo relato, alguns dizem que foram usados como cobaia em aulas
de tortura.
O livro foi um sucesso absoluto quando lançado, vendeu mais
de 100 mil exemplares e teve enorme repercussão no exterior.
Ele ajudou a consagrar, no período da redemocratização, uma
imagem das Forças Armadas associada à repressão, à tortura e à morte. Isso
marcou muito uma geração do Exército brasileiro que, por isso, sempre teve um
projeto revanchista, baseado num processo revisionista.
É por isso que na mentalidade bolsonarista nega-se a
existência de tortura, nega-se que o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, um
dos piores torturadores da história da humanidade, tenha torturado.
A mentalidade bolsonarista não nega apenas a Covid-19, nega
também as torturas da ditadura militar.
Os militares formaram então o projeto Orvil, que é livro ao
contrário, coisa bem de militar.
É literalmente o Brasil: nunca mais de cabeça pra baixo, não
são mais os crimes da ditadura, mas sim os da luta armada. É uma lista longa de
grupos armados, dos desmontes desses grupos e dos crimes que os militares
consideram que eles cometeram."
(...)
(...)
Agora, na narrativa do Orvil, a quarta tentativa de tomada
de poder ocorreu pela tentativa de infiltração nas instituições, sobretudo as
de cultura: imprensa, arte e universidade.
Não é verdade que por trás, por
exemplo, da reunião do dia 22 de abril o ministro do Meio Ambiente disse com
uma desfaçatez muito impressionante:
“Aproveitemos que os olhos da imprensa estão voltados para a
Covid e vamos passar de boiada dispositivos infralegais”?
Em dado momento, a
ministra Damares se vira para o então ministro da Saúde Nelson Teich e diz:
“Ministro, o senhor chegou agora no time. No seu ministério há muitos abortistas
e feministas, não vamos permitir que as grávidas que contraíram Covid façam
aborto”.
Isso é inacreditável.
O ministro da Educação sugere prender os
“vagabundos” do Supremo Tribunal Federal.
Todas as ações do governo são de
destruição das instituições que correspondem às instituições assinaladas pela
narrativa do Orvil como as que pretendem impor o comunismo no Brasil.
Quando eles falam em extrema imprensa, a matriz narrativa está no Orvil.
O que acontece quando você entrega a Fundação Zumbi dos Palmares a uma pessoa que nega a existência do
racismo no Brasil e que sugere que o Dia
da Consciência Negra seja abolido para a criação do dia da Consciência
Humana?
Quando você entrega o Iphan,
um dos órgãos mais antigos e longevos da precária estrutura de cultura no
Brasil, para uma blogueira que se
define como “turismóloga” é a mesma coisa.
A Fundação Casa de
Rui Barbosa, que armazena manuscritos de Clarice Lispector, de Manuel Bandeira,
de Otto Maria Carpeaux, de João Cabral de Melo Neto, da nata da literatura
brasileira, para uma roteirista da TV
Record, a Letícia Dornelles, que não tem qualificação mínima legal para
exercer o cargo, é ou não é uma destruição?
Quando a Capes [Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior] corta 6 mil bolsas de
pós-graduação na calada da noite, é ou não é uma destruição?
O CNPq agora
lançou um edital de iniciação científica e retirou do edital a área de
humanidades. Isto nunca aconteceu em nenhum lugar do mundo. É chocante, mas
segue a narrativa do Orvil. (...)
Se as Forças Armadas embarcarem na aventura golpista do
Bolsonaro, a situação será tenebrosa. As instituições estão demorando a reagir.
Entrevista na íntegra: https://apublica.org/2020/05/quanto-maior-o-colapso-do-governo-maior-a-virulencia-da-guerra-cultural-diz-pesquisador-da-uerj/
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