julho 01, 2020

GOLPE ORVIL



"O que conformou a mentalidade de Jair Messias Bolsonaro e seu clã?"

O Bolsonaro, mais do que um político, é uma franquia; há uma franquia Bolsonaro de políticos.



Para o professor João Cezar de Castro Rocha, a mentalidade de Bolsonaro foi moldada numa linha muito particular do Exército brasileiro: o ressentimento, "a partir da repercussão de um autêntico livro-monumento lançado em 1985 que é o livro Brasil: nunca mais.



Esse é um livro particularmente importante porque denunciou as torturas, as arbitrariedades e desaparecimento de corpos da ditadura militar de uma forma incontestável.

Sob o patrocínio do cardeal dom Paulo Evaristo Arns, ele principiou em 1979, quando os advogados de presos políticos tiveram acesso aos processos de seus clientes e ganharam o direito de ficar com eles durante 24 horas.

Eles xerocaram os processos do Superior Tribunal Militar, reunindo aproximadamente 6 mil páginas, e eis a surpresa: em processos instruídos pela própria Justiça Militar, isto é pela própria ditadura militar, os presos denunciaram aos juízes militares as torturas que haviam sofrido.

O Brasil: nunca mais reúne um conjunto de depoimentos de jovens de 20 e poucos anos, extraídos dos processos da Justiça Militar, em que todos fazem o mesmo relato, alguns dizem que foram usados como cobaia em aulas de tortura.

O livro foi um sucesso absoluto quando lançado, vendeu mais de 100 mil exemplares e teve enorme repercussão no exterior.

Ele ajudou a consagrar, no período da redemocratização, uma imagem das Forças Armadas associada à repressão, à tortura e à morte. Isso marcou muito uma geração do Exército brasileiro que, por isso, sempre teve um projeto revanchista, baseado num processo revisionista.

É por isso que na mentalidade bolsonarista nega-se a existência de tortura, nega-se que o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, um dos piores torturadores da história da humanidade, tenha torturado.

A mentalidade bolsonarista não nega apenas a Covid-19, nega também as torturas da ditadura militar.

Os militares formaram então o projeto Orvil, que é livro ao contrário, coisa bem de militar.

É literalmente o Brasil: nunca mais de cabeça pra baixo, não são mais os crimes da ditadura, mas sim os da luta armada. É uma lista longa de grupos armados, dos desmontes desses grupos e dos crimes que os militares consideram que eles cometeram."

(...)


Agora, na narrativa do Orvil, a quarta tentativa de tomada de poder ocorreu pela tentativa de infiltração nas instituições, sobretudo as de cultura: imprensa, arte e universidade. 

Não é verdade que por trás, por exemplo, da reunião do dia 22 de abril o ministro do Meio Ambiente disse com uma desfaçatez muito impressionante:


“Aproveitemos que os olhos da imprensa estão voltados para a Covid e vamos passar de boiada dispositivos infralegais”?

Em dado momento, a ministra Damares se vira para o então ministro da Saúde Nelson Teich e diz: 

“Ministro, o senhor chegou agora no time. No seu ministério há muitos abortistas e feministas, não vamos permitir que as grávidas que contraíram Covid façam aborto”. 

Isso é inacreditável. 

O ministro da Educação sugere prender os “vagabundos” do Supremo Tribunal Federal. 

Todas as ações do governo são de destruição das instituições que correspondem às instituições assinaladas pela narrativa do Orvil como as que pretendem impor o comunismo no Brasil. 



Quando eles falam em extrema imprensa, a matriz narrativa está no Orvil.

O que acontece quando você entrega a Fundação Zumbi dos Palmares a uma pessoa que nega a existência do racismo no Brasil e que sugere que o Dia da Consciência Negra seja abolido para a criação do dia da Consciência Humana?

Quando você entrega o Iphan, um dos órgãos mais antigos e longevos da precária estrutura de cultura no Brasil, para uma blogueira que se define como “turismóloga” é a mesma coisa.

 A Fundação Casa de Rui Barbosa, que armazena manuscritos de Clarice Lispector, de Manuel Bandeira, de Otto Maria Carpeaux, de João Cabral de Melo Neto, da nata da literatura brasileira, para uma roteirista da TV Record, a Letícia Dornelles, que não tem qualificação mínima legal para exercer o cargo, é ou não é uma destruição?

Quando a Capes [Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior] corta 6 mil bolsas de pós-graduação na calada da noite, é ou não é uma destruição?

O CNPq agora lançou um edital de iniciação científica e retirou do edital a área de humanidades. Isto nunca aconteceu em nenhum lugar do mundo. É chocante, mas segue a narrativa do Orvil. (...)


Se as Forças Armadas embarcarem na aventura golpista do Bolsonaro, a situação será tenebrosa. As instituições estão demorando a reagir.


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