abril 12, 2011

OBSERVÂNCIAS



A tragédia do Realengo escancarou uma porta.
Apenas pense nisso enquanto lembre-se de seus filhos e netos sentados nos bancos escolares ouvindo atentamente o professor - ou não, brincando no recreio - ou não, participando da aula de educação física. Ou não.
Então, um ser humano patologicamente enlouquecido invade esse reduto e acionando o gatilho desperdiça toda uma alegre e sonhadora adolescência.
Em seguida, instalado com microfones e câmeras, o circo da imprensa e sua lente de aumento passam a esquadrinhar a dor e o desespero da comunidade.
E ficamos perplexos em frente à televisão: o Mal brasileiro em destaque no exterior.
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É difícil encarar no espelho a sociedade que somos. Nem melhor, nem pior que os americanos, os hindus ou afegãos, apesar das ideologias vendidas nas páginas impressas, por reportagens televisivas ou na voz de radialistas em seus estúdios climatizados distante quilômetros dos fatos. Há sempre um interesse.
E quando não, preconceito e ignorância.
O que tento dizer é que todos os pais, de qualquer nacionalidade, sofrem indescritivelmente quando vêem seus filhos mortos ou feridos pela violência da estupidez humana -  na gênese da guerra do tráfico, da guerra por petróleo, da guerra por limites geográficos. Sem falar na guerra do trânsito.
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Sem certeza alguma: o que esperar de uma sociedade, anos pós anos, educada por novelas e Big Brother? E refletindo só mais um pouquinho: como a estética carioca, com todos os “valores” cosmopolitas – moda, trabalho, família, traições – chega às casas dos brasileiros que moram no sertão do Piauí ou às margens do rio Madeira na Amazônia ou na colônia do Roncador no interior do Rio Grande do Sul? Não estou procurando culpado, apenas questionando o que nos entorpece, o que nos alivia  além do álcool, das drogas, das orações. E assim vamos criando os filhos, que por sua vez criarão nossos netos.
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A tragédia do Realengo aconteceu dentro de uma escola municipal no Rio de Janeiro. A barbárie foi acometida por um ex-aluno. Talvez em surto psicótico. Talvez um jovem antes de se transformar em monstro. Um filho a quem faltou afeto e proteção. A quem faltou pai e mãe para cobrar da escola a convivência com o bullying do qual vítima.
Ninguém é inocente conforme mostrou o Fantástico. Acrescente-se professores e diretores que taparam o sol com a peneira.
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Surtos como o de Realengo podem acontecer bem aqui na hora do nosso recreio. Não só porque a porta foi escancarada e ganhou todos os holofotes possíveis patrocinados pela sociedade de espetáculo. Mas porque nossa criação não difere da criação carioca. Não vamos nos iludir: assistimos os mesmos canais e desejamos consumir o mesmo que se consome em Copacabana.
Mudam, apenas, os fragmentos de adaptação à realidade.
E assim, ou você se revolta. 
Ou, se resigna.

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