outubro 07, 2010

MAIS UM DILEMA

Fiquei por segundos, hipnotizada, em frente a maquina.

Um fio, um sopro, um toque. O que mudaria no espaço ao redor?

Nada. Absolutamente nada. Seria isso pior que tudo? E tudo seria o que?

No entanto, nós ali, indefesa, eu. Provocadora, ela. Uma encarando a outra. Medindo forças?

- É a sua vez – ouvi um murmúrio.

Olhei para trás e não havia ninguém.

Seria a maquina?

Máquinas não falam garantiu minha lucidez e apenas lembrei do Chico Science: Um passo à frente e você não está mais no mesmo lugar. E lamentei sua morte prematura. E lamentei que um dia desapareceram com o meu cd Da Lama ao Caos:

Posso sair daqui para me organizar
Posso sair daqui para desorganizar


É o que espero das pessoas que sentem na alma, refletem na pele ou se confrontam nas suas escolhas sexuais e religiosas, dolorosamente, os inerentes prejuízos de uma sociedade preconceituosa.

- Coragem... ela incentiva - juro, escutei com clareza.

Tudo isso como num flash neuronial - se é que já inventaram isso. Vi e ouvi. Não estou ficando louca. E piorando as coisas:

Da lama ao caos, do caos à lama.

Um homem roubado nunca se engana

Nesse momento, apesar do frescor da manhã de Outubro, comecei a suar. Uma crise de fatalismo àquela hora? Além de nós duas na sala sem janela, mais algumas aguardavam por ali o momento do confronto. Sim, a hora decisiva.

A melodia do Chico nos meus ouvidos ressonando ao som dos tambores: da lama ao caos, do caos à lama, da lama ...

E agora bastava apenas me concentrar e tocar. Expressar meu desejo que também nem era desejo, era dor e humilhação. Nada mudaria, lembram? Ou teria realmente alguma influência no futuro?

Com a barriga vazia não consigo dormir
E com o bucho mais cheio comecei a pensar
Que eu me organizando posso desorganizar

No devir nada é perene. É o que me conforta. Então, se organizem para desorganizar.

Por precaução, mas com todas as dúvidas ainda sangrando, encarei a maquina e seu risinho debochado. Avante mulher sem fé!

E assim liberta do transe paranóico, votei.

Depois, saí arrastando minha consciência pelas calçadas sujas de homens que roubam e traem nossa confiança.

* Agora, por favor, devolvam meu cd.

** Crônica no A Hora e Opinião.

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