DESCARTE DO ANO
Tarde fisguenta, úmida, cinza. Tento por ordem nos caos da minha caverna. Não sei bem por onde começar... Esvazio o lixo. Para depois encher novamente. Devoro uns merenguinhos: preciso de açúcar na veia. Embaixo de papéis descubro o celular q pensei já perdido com apenas três semanas de uso. Sim, tenho um celular. Procuro papel para embrulhar um cd q comprei p presentar no Natal. Desisto e rasgo o celofane p escutar. É ótimo e renuncio ao amigo-secreto. E depois não tenho papel de presente. Mais merenguinhos... Um colar de contas, um chaveiro, grampos de varal, cartões. Cada um para uma caixa. Sento no chão separando papéis e jornais q me interessam. Acho meus gibis antigos e livros infantis. Os primeiros voltam p o gavetão, os livros p uma prateleira onde sei q vou esquecer. Guardo tantas coisas importantes: um rabisco onde leio na minha quase indecifrável caligrafia “Não sabemos se o universo pertence ao gênero realista ou ao gênero fantastico.” De quem é essa fulguração? De Borges? Ou de quem mais poderia ser? Dali? Khalo? Merenguinhos... O q tem realmente de valor nessas gavetas, prateleiras, caixas, caixinhas? Tudo tem voz. Tudo me cala e dá o sentido da minha profunda ignorância a cerca dos mistérios da vida e da literatura. O mundo é tecnopop e eu me preocupando em guardar papéis, recortes e jornais velhos. Nunca pensei que faria isso: no lixo uma revista Piauí. Jamais pensei q seria capaz. Poderia ter guardado p outro. Quem? Não conheço ninguém nessa cidade q compra e lê a Piauí. Por fim, levantei um bloco antigo de anotações p futuros contos e o que achei? Um chiclé... Mastigado e grudado na mesa. Vergonha. Suspiro: lá se vão três sacos de lixo - grande -com todos os papéis e jornais guardados durante 2009... e pra q? pra q? Ainda tenho uma prateleira dentro de um armário me encarando. Puxo tudo p fora: sacolas de papelão, de plástico, colcha velha, um pé de tênis desparcerado, a furadeira!, cartas do tempo em que se escrevia cartas, cartões novos e velhos e... noooossa!
Um cartão de 18 de junho de 1976. Um cartão dos meus queridos amigos. De quando eles foram embora para os States me abandonando nessa colônia onde vivo até hoje.
Lembro que chorei quando recebi.
Tinha 18 anos e queria correr o mundo e fugir dos julgamentos do povo e suas condenações hipócritas, preconceituosas e burras.
“É isso aí cabeças feita pra não dar bandeira” – escreveu Maneco.
Depois que a gente entra no sistema deles a gente se liberta mesmo.” – Jumbo.
“A presença de vocês pintô no astral” – Serjão.
Terminei com todo o pacote de merenguinhos.
Como descartar os anos 70?
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