junho 18, 2011

PERIGOS DE OUTONO



Tarde vazia na minha rua. Uma moto passa devagarzinho.
Vai até a esquina. Volta. Estaciona embaixo do hibisco na calçada.
Um rapaz, sentado na moto, espera.
Vou até à janela e confiro a vizinhança. Tudo  fechado.
Um deserto de outono.
Propício para o azar. Um arrepio no cangote, sabe cumequié, dona Leda?
O rapaz na moto. Eu na janela já pela terceira vez: confiro.
Devo ligar para a polícia?
Moto parada na frente de casa. Muito estranho.
Quase todas as casas já foram assaltadas. Só na nossa quadra!
Faltam apenas duas. E uma delas é a minha.
O  motoqueiro me observa com o canto dos olhos. Não diz nada.
Boné com aba virada na cabeça. Um perigo.
Pelo menos não é touca ninja. Mas onde escondeu o capacete?
Ele também me olha, desconfiando da minha desconfiança.
Eu me afasto da janela. Porem esqueço minha sombra e ele percebe.
Será que grito? Grito como?
Berrar por socorro a uma e meia da tarde soa tão ridículo.
Melhor ligar para a polícia.
Elemento motorizado, em frente a minha casa observando tudo.
*
Ainda lembro que no mês passado, três desses elementos estranhos, noite escura, pularam o muro do vizinho.
Sem hesitar, chamei a Brigada. Vieram imediatamente.
Apontei aflita a esquina: já desceram por ali e acho que ouvi passos no pátio.
No pátio do vizinho? Do outro lado da rua?
Escutei sim! Tenho certeza.
Os soldados  espiaram com os ouvidos. Nada.
Mas seguiram atrás da minha indicação.
Nem cinco minutos, retornaram: eram dois garotos e um rapaz.
Tinham os bolsos cheios de frutas.
Colhiam ingás no vizinho. Dos galhos que pendiam na calçada...
Respiro aliviada. Agradeço. Peço desculpa, dê por conta do medo, os assaltos, o arrepio no cangote, sabe cumequié, d. Leda!
Sim, os soldados gentis da Brigada Militar entenderam.
*
Desta vez, resolvo não chamar a polícia para tirar satisfação do motoqueiro quase quinze longos minutos, parasitado em frente a minha casa.
Mas foi só me distrair e quando espio novamente a moto no local – sem o motoqueiro.
A rua de outono deserto, já disse, eu sei, mas agora os passos em frente a garagem e meu coração dispara, a boca seca, taquicardia. Muitos passos. Uma quadrilha?
Não. Não. Não.
Era o pessoal que vinha instalar um split na minha casa e o motoqueiro esperava o patrão.
Quequitem, d. Leda?
Até o Palocci tem cara de bonzinho e a senhora viu no que deu.

Publicado: jornais A Hora, Opinião e site Região dos Vales

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial