junho 03, 2010

IMPLICÂNCIA OU CRIME?

Lembranças de criança?
É preciso um grande esforço para trazer de volta uma magricela do tempo de Grupo Escolar, volta e meia, em escaramuças na hora do recreio:
- Esqueleto ambulante!
- Taquarinha! Taquarinha!

Tumulto criado, atraques, lágrimas e joelho esfolado. Em casa, uma palmada bem dada para aprender a não brigar no colégio que isso não era coisa de guria direita.
- Pau de vira tripa!
- Taquarinha! Taquarinha!

Desforra? Fim de aula, guarda-chuvada e puxões de cabelos em quem nem tinha culpa, imagino. Em casa, mais palmadas. Até aprender.
- Taquarinha! Taquarinha!

Um dia pulavam corda no recreio, quando ouviu as risadas e a zombaria. Sem hesitar, deu uma laçada nas pernas dos meninos, das meninas e de quem mais próximo. Vergões, pranto e na hora do separa, separa, sobrou até para a profe Odete. De orelha esticada e vermelha, quase arrastada pelo corredor, um longo caminho até a sala da diretora. Isso são modos? Chama a mãe dessa guria e vamos resolver logo isso.
Castigo na sala de aula, escrever 100 vezes meninas ajuizadas não brigam, e mais o castigo em casa.
- Galinha, galinha!

Aos 13 anos, a angustia de adolescer. Agarrada aos cabelos uma da outra descem a escada do colégio evangélico rolando pelos degraus, aos berros de uma torcida parcial. Na frente de um diretor enfurecido, o veredicto: galinhas. E elas engolem.
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O que mudou nesses 40 anos que separam um passado acomodado, mas não esquecido?
A discriminação? Os limites? A educação?
Tudo.
A começar pela nomenclatura: bullying. Tão terrível que acharam um jeito de americanizar a humilhação e a discriminação escolar. Deriva de “bully”: brigão, valentão, mandão; ameaçar, intimidar, assustar - informa o pequeno minidicionário Michaelis, que achei no fundo de um armário velho.

Fala daqui, fala dali, mais os jornais e as reportagens na tevê, capa de revista, o assunto bombando:
- Na minha escola não tem disso. Os professores não deixam ninguém humilhar ninguém – disse um jovem de Estrela. Tá, e quando eles não estão por perto?
- Que vergonha, a gente incomodava tanto as colegas... – lembrou um rapaz nos seus 25 anos.
- Minha turma pegava pesado com o pessoal que vinha do interior – confessou outro.

Não era diferente no passado, mas era exceção. Agora, passou a ser regra.
E as humilhações são filmadas, fotografadas e vão parar na internet. O mundo todo pode gritar em uníssono: Taquarinha! Taquarinha!
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“Um estudante da 7ª série, de um colégio particular de Belo Horizonte, foi condenado a pagar uma indenização de R$ 8 mil a uma colega de classe por ter praticado bullying. A vítima relatou que, em pouco tempo de convivência escolar, o garoto começou a lhe colocar apelidos e fazer insinuações.”

Falha a família, falha a escola, mas que não falhe a sociedade.
* Minha crônica nos jornais Opinião de Encantado, A Hora de Lajeado, e site Região dos Vales.

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