maio 05, 2009

Fantasmas sem memória

Não sei como a Clarice Lispector conseguia escrever em casa, com filhos e a louça na pia, cama por fazer, tulha entupida, casa bagunçada. Li que enquanto a rotina do lar respirava ela seguia escrevendo sobre os joelhos para não perder as idéias, o ritmo e o fio. Tento...
Sem vocação para Clarice me perco entre uma máquina de roupa suja e o varal, entre o fogão sujo de leite derramado e o telefone esquizofrênico, procurando meus óculos que caminham ou um rolo de barbante para amarrar um jasmim na antena parabólica - que é para isso que serve mesmo - e claro, não tenho a talentosa perspicácia clariceana de mundo.
No ano passado participei do Fronteiras e anotei uma frase do escritor Milton Hatoum, aquele que escreveu Dois Irmãos e que eu ainda não li:
“No fundo o que a gente escreve é a história de nossos fantasmas, dos espectros...”
É o que estou fazendo confusamente e sem saber onde chegar. Se é que vou descobrir um cais de regresso. Falo em ficção, mas enrustida por um fio original que trapaceia com o passado. É para alguns identificar suas alegrias, afinal, que graça tem não dividir o passado? Principalmente quando vivíamos tempos tão criativos sem internet e sem tevê à cabo e sem grana. Passando a régua, construímos uma identidade acomodada: do clube para casa, da casa para a pizzaria, da pizzaria para o trabalho e no final do dia uma passada na locadora de vídeo. Ou no super. Quem foi que disse que nossa identidade se define pelas escolhas que fizemos, pelas experiências que vivemos? Mas, assim amarrada ao pé da cama box...

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