FLAVIO TAVARES
* Para o jornal O Estado de São Paulo, ontem:
Vivemos num país que não tem pena de morte.
Nenhum juiz pode sentenciar à morte sequer o criminoso mais
perverso, mesmo com base num minucioso processo que demonstre a sanha da
perversão.
O “direito de matar”, porém, parece reservado à polícia. Sim, pois na realidade assim é, como se demonstrou na recente execução de Genivaldo de Jesus Santos pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), em Sergipe.
Estarrecidos, vimos até a cena do assassinato, transmitida pela televisão: algemado, ele é colocado no porta-malas da viatura policial e esperneia, tentando livrar-se do suplício, pois os policiais acionam o gás lá contido e ele sente a asfixia. Logo, morre asfixiado, como se as câmaras de gás dos campos de extermínio nazistas se reimplantassem no Brasil.
Indaga-se: que crime abominável cometeu Genivaldo de Jesus para ser algemado e tratado daquela forma pela Polícia Rodoviária, que vigia as estradas?
Ele foi interceptado por ser motociclista sem capacete de proteção na rodovia. Por não se autoproteger, foi levado à morte pela polícia...
O mais estranho, porém, foi a reação inicial dos dirigentes da Polícia Rodoviária Federal, que – de fato – justificaram a ação dos policiais alegando que a vítima oferecera “resistência”. Só mais tarde, após o crime repercutir pelo País, a PRF disse em nota que a ação contrariava as normas da corporação.
Os absurdos vão adiante, porém, capitaneados pelo próprio presidente da República.
O que seria “excesso de justiça”? – eis a indagação que desafia entender o que é justo ou injusto.
De um lado, o assassinato do humilde sergipano (que
sofria de esquizofrenia e, assim, discernia com dificuldade entre certo e
errado) faz dele uma vítima-símbolo da violência policial.
De outro lado, porém, há fatos e empreendimentos que são tão transformadores em si que passam a ser símbolos positivos. Em qualquer caso, quando algum acidente tira deles a essência e o brilho próprios, cai todo o arcabouço.
No Brasil, este é (ou foi) o caso da Petrobras, símbolo de nosso dinamismo e criatividade.
Sim, pois a Petrobras foi tal qual a bandeira como símbolo pátrio. Já nasceu lutando, numa batalha por nossa independência. “O petróleo é nosso” foi, nos anos 1940-1950, o lema de um combate verbal diuturno que levou à prisão milhares de brasileiros, numa campanha pela libertação econômica do País, mas que o tacanho conservadorismo no poder tachava de “agitação comunista”.
A luta por “o petróleo é nosso” só se materializou com a
criação da Petrobras, em 1953, no governo Vargas. Na época, o petróleo
significava a emancipação econômico-social, e tomamos a empresa como a alforria
do povo e da Nação. A Petrobras tornou-se a maior empresa do País e da América
Latina, distante da politicalha partidária.
Com isso, chegou ao descobrimento do pré-sal.
Empresa pública sob domínio do governo federal com minoritário capital privado, foi tratada respeitosamente até nos anos da ditadura militar, quando o poder se exercia de cima para baixo, autoritariamente.
Há pouco, Bolsonaro indicou o quarto presidente da Petrobras em três anos e meio do atual interrompendo uma gestão que recém se preparava para agir. Dessa forma, quebrou a continuidade administrativa da empresa num momento de crise mundial, em que o preço internacional do petróleo aumenta dia após dia, puxado pela invasão da Rússia à Ucrânia.
E tudo numa tentativa de reduzir o preço do combustível ao público, como diz o próprio Bolsonaro. O futuro novo presidente da empresa é secretário de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, mas nunca atuou na área de petróleo.
Os especialistas não o veem apto a (num passe de mágica) “baixar o preço dos combustíveis”, que levou Bolsonaro a indicá-lo para a Petrobras. O alto preço atual da gasolina e do diesel está atrelado à desvalorização do real ante o dólar.
No fundo, tudo se deve ao fantasma da inflação, visível no aumento de preços dos bens essenciais. Mas isso, por acaso, não é, também, um símbolo da confusa administração federal?
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